terça-feira, 26 de julho de 2011

Mais ou menos...humanos?





Cada vez que ligo a TV, ou leio as manchetes, encontro situações que me surpreendem, tanto pelo grau da barbárie, quanto pelo nível de intolerância ainda existente, num mundo que muitos consideram evoluído.
Notícias de violência gratuita já são lugar comum na imprensa, como aquela que relatava a história de um pai e um filho que foram atacados durante um rodeio, porque foram confundidos com gays. Como se a opção sexual de alguém fosse justificativa pra esse tipo de violência.



O incrível é que para muitos essa é sim uma boa razão e os responsáveis, em sua maioria, não são os pobres, aqueles a quem normalmente são atribuídos os crimes violentos (vide Datena e similares). Os crimes de intolerância costumam vir dos “bem nascidos”, dos que tiveram acesso à educação, aos bens de consumo, e a um repertório cultural que, em tese, deveria fazer deles pessoas melhores. Ledo engano! Isso não aconteceu, e talvez as vantagens tenham dado a essas pessoas o falso senso de superioridade que as orienta a agir assim. Viver em um mundo dominado pelo preconceito e classificações que dividem o planeta entre os “mais ou menos” humanos, de acordo com critérios étnicos e culturais arbitrários é um desafio que tem crescido cada vez mais, principalmente porque, ao contrário da violência gerada pela pobreza e pela exclusão, essa não é gerada pela falta de oportunidades.



Não que uma seja melhor que a outra, mas a violência da qual estamos falando é mais difícil de ser combatida, porque vem justamente de uma certeza absoluta e cegante de que existe um padrão para a orientação sexual, para a cor, para o gênero, e consequentemente, em um nível mais extremo, existe o ódio como resposta a tudo que não se assemelhe ao “padrão”.


Recentemente assistimos atônitos ao atentado terrorista que vitimou várias pessoas na Noruega e, contrariando uma percepção preconceituosa e errônea, o ato não veio de nenhum muçulmano (como se o terrorismo fosse uma exclusividade deles, ou estivesse intrinsecamente ligado àquela cultura). O atentado veio de dentro e foi motivado pela mesma certeza de superioridade citada anteriormente. O atirador Anders Behring Breivik escreveu um manifesto no qual acusava a Europa de seguir um caminho semelhante ao do Brasil, no que refere-se à miscigenação e mistura de culturas, experiência que ele apontava como a responsável pelos “problemas” e atraso do país.


Essa visão estereotipada, capaz de atribuir mais ou menos humanidade a determinados grupos, fez com que outros garotos “bem nascidos” ateassem fogo ao índio pataxó Galdino Jesus dos Santos em Brasília, além de outros incontáveis crimes contra a vida. Quando entrevistados disseram que pensavam se tratar de um mendigo.


Mais uma vez o discurso demonstrou claramente a ausência de empatia e a total falta de humanidade, ou “excesso” dela, já que cada vez me convenço mais, salvo raras exceções, de que a espécie é realmente auto-destrutiva. No fim das contas, são as excessões que mantêm minha crença nas possibilidades de mudança.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Indignação




Ontem recebi uma notícia triste pelo facebook. Um texto que contava como o Alexandre de Sena, ator mineiro que estava em Blumenau a trabalho, foi covardemente espancado por policiais. Um detalhe: Alexandre é negro. Não que a truculência policial só atinja negros, mas a forma como ele foi abordado é uma demonstração típica de preconceito, tão naturalizado no Brasil que se torna quase imperceptível.

Alexandre estava esperando alguns amigos em um posto de conveniências quando o PM ordenou que ele se retirasse utilizando a frase”vaza negão”.
Ele educadamente (e corajosamente também) respondeu que não iria sair dali enquanto os amigos não terminassem suas compras e retrucou a forma desrespeitosa como foi abordado.


A resposta foi uma série de agressões injustificadas contra alguém que estava desarmado, não representava ameaça de espécie alguma e apenas exigiu o respeito que lhe era devido. O mesmo tratamento raramente seria dado a alguém que se encaixasse no estereótipo dos “dignos” de respeito. É o reflexo claro de um país que ainda se mostra intolerante em pleno século XXI. Racista, para ser mais exato, algo que não se reflete apenas nesse episódio mas em números estatísticos absurdos que melhoram muito pouco a cada ano.


Uma observação minha: conversei com o Alexandre em poucas oportunidades mas sei que se trata de uma pessoa de boa índole. Trata-se de alguém extremamente cortez, que em nenhum momento desacataria ou desrespeitaria qualquer outro indivíduo (independente da patente) mas, como fez muito bem, não se permitiria ser uma vítima gratuita do abuso dessa mesma autoridade.


Não atenua, mas ele é um caso especial, porque é um negro que pôde estudar, não é vítima, também, da invisibilidade social. E quanto aos vários que sofrem o mesmo tipo de abuso e não tem sequer as ferramentas para denunciar? Ou ainda, não conseguem perceber o quanto esses policiais estão errados, assim como o Fabiano de Vidas Secas, que não podia conceber que uma autoridade estaria errada ao lhe tratar daquela forma, tão violenta.


Alexandre pelo menos está entre os letrados, entre os que tem acesso à rede, entre os que conseguem notar as diferenças de tratamento que existem por traz da nossa sociedade miscigenada e tão “livre” de preconceitos. Fica a indignação. Mas ela basta? Muda algo?
Apenas ela não!

quarta-feira, 13 de julho de 2011

O adeus do Lapa Multshow





No dia 10 de julho, sábado, o Lapa Multshow, importante espaço da cultura musical de Belo Horizonte, encerrou suas atividades. Após mais de 14 anos e uma sériede shows realizados com artistas dos gêneros mais variados, a casa situada no bairro Santa Efigênia deixa de fazer parte das nossas opções de final de semana. Difícil é não se sentir um pouco órfão, principalmente se você, como eu, acompanha de perto o cenário cultura da cidade. O Lapa era mais um dos símbolos do que BH produz de melhor em termo de música, ao lado de lugares igualmente importantes como A obra, Matriz, Bordelo, etc e etc.

Quando, no início do ano, tivemos uma conversa com o Guilardo Veloso (responsável pelo Lapa) e ele nos contou sobre a “ordem de despejo” que havia recebido da imobiliária, começamos a imaginar formas de impedir aquilo. O Lapa iria deixar de ser “o Lapa” para se tornar um supermercado ou coisa que o valha. A cidade inteira sairia perdendo. Para mim, pessoalmente, a perda tinha um peso muito grande. Principalmente pelo fato de o Guilardo ter recebido minha banda para que realizássemos o show de lançamento do nosso primeiro CD, em um esquema de parceria que nós nem imaginávamos que fosse acontecer. E o mesmo foi feito com outros, colocando em primeiro plano, sempre, a relevância da proposta e não a sua capacidade de levar um número x ou y de público.

No fim das contas nos despedimos do Lapa Multshow, palco que recebeu vários artistas locais como Eminence, Renegado, Julgamento (nós), Transmissor, Capim Seco e Pedro Morais (só para citar alguns), e também nomes como Mundo Livre S/A, Nação Zumbi, Tulipa Ruiz, Lucas Santana e tantos outros.


Continuidade

Foi cogitada a possibilidade de solicitar o tombamento do lugar e logo depois pedir à prefeitura que o transformasse em uma espécie de centro cultural, gerenciado pela sociedade civil. A discussão foi levantada e levada adiante e, para surpresa geral, o objetivo foi alcançado.

O lugar que durante tantos anos foi o Lapa Mulsthow pode, de fato , continuar como espaço para a divulgação da pluralidade musical e cultural da cidade. Ainda não se pode afirmar como, quando e se isso irá mesmo acontecer, mas a proximidade das eleições foi um fator decisivo, na minha opinião, para que o prefeito apoiasse a causa, principalmente diante do desgaste das suas relações com o setor cultural.


Para todos os efeitos, o processo está em andamento. Resta saber se o imóvel, de fato, irá continuar como o lugar em que artistas de diversos segmentos se projetam para um público que, felizmente, têm procurado mais do que é oferecido nas FMs e canais de TV. Só o tempo dirá.


Em tempo, nosso muito obrigado a Guilardo, Vinícius e toda a equipe que fez do Lapa o que ele foi, um lugar que ficará na memória de quem o conheceu, com seus grandes shows e noites inesquecíveis.